Dia do Professor

DIA DO PROFESSOR

Dispenso felicitações por este meu dia,
eu que professo, ensino em troca de pão.
Dispenso que me desejem este meu dia
feliz como um dia de picnic com a família.

Eu me recuso a este prêmio mesquinho.
Porque beira à desonestidade, à hipocrisia
receber da sociedade esta deferência,
quando, nos restantes dias do ano,
a mesma sociedade relega o professor ao abandono,
ao descaso com que as autoridades o tratam.

Dispenso felicitações por este meu dia,
mesmo sabendo que boa parte de meus alunos
o faça de coração,

O governo de um certo Estado
bota a tropa de choque para bater nos professores.
No meu Estado, a greve de professores
atinge sessenta dias e isso não importa.
Governo e mídia emudeceram.
Aquele governador que furtou a merenda
e surrou alunos em protesto,
acusou seus professores de aparelhamento ideológico.
E seu partido foi reconfirmado nas urnas.

Como acreditar que a sociedade ama seus professores?

O novo ministro, que nunca deu aula,
declara que qualquer conhecedor é suficiente
para se tornar um professor.
E entende que os fracassos do ensino
está exclusivamente em quem ensina.
E, em nome da economia,
corta investimentos na Educação.

Como não tomar homenagens no dia de hoje
como piadas de mau gosto?
Sobretudo se partem de autoridades e gestões?

Nossos políticos aprovam leis
que congelam salários num país tangido a inflações.
Todo esse amor eu dispenso.
O professor, condenado como sempre fora à subsistência,
ficará programaticamente mais empobrecido.
Dispenso as felicitações.

Eu te amo, mas quero tua casa.
Eu te amo, mas quero tua aposentadoria.
Eu te amo, mas quero tua saúde, tua comida, teu sossego.

No dia do professor, nesta metade de outubro,
eu espero a sinceridade cristalina:
“Professor, nós te odiamos.”
“Professor, nós te queremos morto.”
“Professor, nós queremos que o raio te parta.”

Isso para estes versos ficarem palatáveis.
Porque, bem ao gosto das turbas que outrora
bateram panelas contra a corrupção e hoje se calam,
as palavras explicitamente mais exatas seriam estas:
“Professor, vai tomar no cu!”
“Professor, vai à puta que te pariu!”
“Professor, fode-te!”

Confesso: até eu me sinto
escandalizado com estes versos.

É que já me fizeram crer
que minha condição de resíduo
é apenas fruto de minha inflexibilidade.
E que eu não lucro mais direitos
porque vivo embotando diálogos.
Mesmo que meus diálogos quase sempre
sejam precedidos de pau no crânio
e borracha no lombo.

Neste meu dia, não me felicitem.
Dispenso hipocrisias.
Dispenso falsas generosidades.

Imagem: Janus Korczak (educador polonês, morto na câmara de gás junto com suas duzentas crianças, em 1942).

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